Os músicos do Pará registram o centenário de nascimento de Altino Pimenta, compositor paraense cuja figura e atuação em nosso meio musical foi das mais relevantes.

A Academia Paraense de Música, cuja presidente é a pianista e mestra Eliana Cutrim - querida companheira de tantos concertos - apresenta várias homenagens ao nosso festejado aniversariante.

Gosto de relembrar a personalidade entusiástica de Altino Pimenta, ao impulsionar os jovens estudantes de música a estudarem outros instrumentos que não fosse o piano, embora ele fosse um pianista brilhante e escrevesse para este instrumento.

Altino desejava ver/ouvir orquestras atuando em nossa cidade, cujos componentes fossem músicos do Pará.

Quando o Projeto Espiral foi instalado no Conservatório Carlos Gomes, com professores estrangeiros ensinando violino, violoncelo, contrabaixo, instrumentos de sopro e percussão, Altino, que era Diretor do Serviço de Atividades Musicais da UFPA (SAM), incentivou seus alunos a estudarem estes instrumentos no Conservatório. É dessa geração o saudoso Paulo Keuffer.

Altino sonhava interiorizar o ensino da música e elaborou um Projeto pelo qual professores de música fossem dar aulas e recitais no interior do Pará.

Participei desse momento pedagógico e, como professores, fizemos várias visitas às escolas do interior, sentindo a grande precariedade das nossas cidades interioranas quanto ao ensino da música chamada “clássica”. Com a companhia de sua esposa, dona Júlia Pimenta, que organizava a parte prática do Projeto (pousadas, lanches, transporte dos instrumentos, etc.), o nosso entusiasmado compositor conseguiu levar conhecimento musical a crianças e jovens do nosso interior.

Dona Júlia também deu coragem a Altino para entrar em avião e ir aos Estados Unidos, onde deu recitais e lançou sua obra em algumas cidades. Em uma dessas incursões. A Profa. Itacy Silva e eu fomos dar aulas de musicalização, levando uma caixa de instrumentos de percussão feitos com material da terra: castanhas do Pará, cascas de coco, etc. A caixa ficou do lado de fora do nosso quarto e, no dia seguinte, ao aproximar-se dos instrumentos, Itacy quase desmaia: uma cobra, no meio dos instrumentos! Chamamos o rapaz da pousada, que retirou o animal. Pedi então ao dono que nos transferisse para outro quarto, longe do quintal com as árvores.

- Por que a senhora quer sair? Não tem mais cobra!

- Mas… - disse eu – minha mãe dizia que quando um bicho morre, o macho ou a fêmea aparece depois…

- Ah, minha senhora. Não se preocupe. Essa cobra aí era divorciada!

Rimos e ele atendeu nosso pedido...

O Duo Pianístico da UFPA – Lenora Brito e Eliana Cutrim – solicitou ao renomado compositor Ernst Mahle que fizesse um arranjo para piano a 4 mãos da composição Suíte Funcional, de Altino Pimenta. A Swing Valsa, a terceira parte da Suíte, está registrada no CD A Música e o Pará, executada pelo Duo.

Altino Pimenta, ao improvisar ao piano, a música brotava com extrema facilidade. Certo dia, ao descer as escadas do SAM, saindo da sala de aula, ouvi um delicioso improvisado sobre tangos argentinos. Eram Altino e Luíza Camargo – outra grande pianista paraense – a “brincar” com os tangos de Piazolla.

Altino colocou música em poesias de vários poetas paraenses: Paes Loureiro, Acyr Castro, José Wilson Malheiros, Antonio Tavernard e também em versos que escreveu.

De meu pai, o poeta Bruno de Menezes, Altino musicou, com muito lirismo, o Soneto à Lua. Altino pedira às minhas irmãs Maria Ruth e Maria de Belém que lhe sugerissem o poema a ser musicado. Sabedoras do amor que nosso pai dedicava ao luar e à lua, chamando-a de “bailarina imemorial dos ares”, “grande lírio a balançar entre as estrelas”, “camélia argêntea” - elas lhe sugeriram o poema citado.
Essas canções encontram-se registradas no CD O Canto da Amazônia, Projeto Uirapuru.

Para esse CD, a pedido de Altino Pimenta, tive a honra e alegria de escrever a Apresentação, na qual, entrelaçando versos dos poemas musicados, faço votos de grande sucesso para a obra do nosso compositor. Peço a meus possíveis leitores licença para transcrevê-la:

Que esta obra de Altino Pimenta prossiga “livre, sem rotas, leve, enlevando”, ainda que “vibrando de emoções incalmas”, “correndo pelos campos e colinas”, “passe noite, passe aurora”, e mesmo “que os invernos se prolonguem”, vá ao “encontro do Rio Mar”, ritmada no “batuque que estruge”, benzida por “um pé de tambatajá”, afastando a “solidão cansada”, “brincando com os sonhos na trama do vento”, “no meio da pureza”, e que “chova enternecidamente” sobre esta “Estrela”, a homenagem de outros artistas que haverão de perpetuá-la, sem esperar “solene resposta”, fortes na sua arte que “consegue afastar a tormenta e ver renascer o sol”.

Belém, Maio de 2021

MARIA LENORA MENEZES DE BRITO, ocupante da Cadeira 01 da Academia Paraense de Música tendo como Patrono Henrique Gurjão.

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